A Constituição Federal, em seu art. 226, §7º, estabelece que "fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privada." Na mesma linha, o Código Civil, no capítulo concernente à eficácia do casamento, expressa redação semelhante (art. 1.565, §2º, do Código Civil), verbis "o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privada."
A fim de regulamentar o dispositivo constitucional contido no art. 226, §7º, foi editada a Lei n. 9.263/1996 a qual estabelece, em seu art. 2º, "que o planejamento familiar é direito de todo cidadão, entendendo-se este como o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal."
Verifica-se da leitura dos artigos 10-III e 35-C, da Lei n. 9.656/1998 (Lei dos Planos de Saúde), que a legislação é expressa e categórica no sentido de excluir a inseminação artificial da cobertura obrigatória a ser oferecida pelos planos de saúde aos consumidores/pacientes, sendo, pois, facultativa a inclusão da referida assistência nos respectivos contratos de saúde.
Diante da amplitude da expressão inseminação artificial, a ANS procurou, por meio de seus atos normativos, esclarecer o alcance do termo, tendo editado a Resolução Normativa n. 192, de 27 de maio de 2009, a qual estabeleceu como de cobertura obrigatória os seguintes procedimentos médicos relacionados ao planejamento familiar: i) consulta de aconselhamento para planejamento familiar; ii) atividade educacional para planejamento familiar; iii) implante de dispositivo intra-uterino (DIU).
É importante registrar a previsão contida no art. 1º, § 2º, da referida resolução no sentido de que "a inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar, definidos nos incisos III e VI do art. 13 da Resolução Normativa - RN n. 167, de 9 de janeiro de 2008, não são de cobertura obrigatória de acordo com o disposto nos incisos III e VI do art. 10 da Lei nº 9.656, de 1998 e, não estão incluídos na abrangência desta Resolução".
Na mesma linha, a redação da Resolução n. 428/ANS, de 7 de novembro de 2017, reproduz o conteúdo do art. 20, § 1º, da anterior Resolução nº 387/ANS, de 28 de outubro de 2015, ao dispor que (...) "São permitidas as seguintes exclusões assistenciais: (...) III - inseminação artificial, entendida como técnica de reprodução assistida que inclui a manipulação de oócitos e esperma para alcançar a fertilização, por meio de injeções de esperma intracitoplasmáticas, transferência intrafalopiana de gameta, doação de oócitos, indução da ovulação, concepção póstuma, recuperação espermática ou transferência intratubária do zigoto, entre outras técnicas."
É imperioso concluir que a exclusão de cobertura obrigatória da técnica de inseminação artificial, consignadas em ambas as resoluções normativas da ANS, possuem, como fundamento, a própria lei que regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde, o qual estabeleceu, em seu art. 10, inciso III, verbis: "É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil (...), exceto: III - inseminação artificial."
A propósito, consoante destacado pelo Min. Marco Aurélio Bellizze na oportunidade do julgamento do REsp 1.692.179/SP (Dje de 15/12/2017) "(...) segundo o art. 20, § 1º, inciso III, da Resolução Normativa n. 387/2015 da ANS é permitida a exclusão da cobertura assistencial não só da inseminação artificial, mas, também, de outras técnicas de reprodução assistida."
De fato, não há, pois, lógica que o procedimento médico de inseminação artificial seja, por um lado, de cobertura facultativa - consoante a regra do art. 10, III, da lei de regência - e, por outro, a fertilização in vitro, que possui característica complexa e onerosa tenha cobertura obrigatória.
Permitir interpretação absolutamente abrangente acerca do alcance do termo "planejamento familiar", de modo a determinar cobertura obrigatória da fertilização in vitro, acarretará, inegavelmente, direta e indesejável repercussão no equilíbrio econômico-financeiro do plano, a prejudicar, sem dúvida, os segurados e a própria higidez do sistema de suplementação privada de assistência à saúde.
Em controvérsias deste jaez a interpretação deve ocorrer de maneira sistemática e teleológica, de modo a conferir exegese que garanta o equilíbrio atuarial do sistema de suplementação privada de assistência à saúde, não podendo as operadoras de planos de saúde serem obrigadas ao custeio de procedimentos que são, segundo a lei de regência e a própria regulamentação da ANS, de natureza facultativa, salvo, evidentemente, expressa previsão contratual.
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